terça-feira, 30 de junho de 2009

Estendal português

«Angola reclama 700 milhões de dólares depositados em Portugal transferidos de contas na Suíça». É o próprio banco supervisor, o Banco Nacional de Angola, quem reclama a propriedade deste dinheiro. E lá terá as suas razões. Afinal, num país onde uma simples transferência de 5 mil dólares para o exterior obriga a prévio licenciamento do Ministério do Comércio e à apresentação dos justificativos da transacção subjacente, certamente que o banco central deverá ter bem documentada a origem destes 700 milhões de dólares.

Morte em directo

Nambuangongo

Entre a candura das pretensões dos actuais responsáveis de Nambuangongo e a lendária e sangrenta versão dos acontecimentos ocorridos na cidade-marco da guerra colonial navegam páginas carregadas de História de Portugal e de Angola. Nem sempre justas, claras, ou limpas. Como, porventura, também o não serão as versões que dela se fizeram.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Princesa Isabel

«Esta mulher não pára». Há mais uma aliança no portfolio de Isabel dos Santos. Desta vez é com a Sonae. Não duvido que os supermercados Continente, mais a gestão de um dos mais eficientes grupos de distribuição europeus, seriam um sucesso em Angola. País que até poderia aproveitar esta oportunidade para desenvolver alguns sectores da sua imberbe produção interna. E que a chave deste casamento, ainda que polígamo, está no facto de ser feito com quem realmente interessa. Actualmente. Resta saber o que acontecerá no futuro se a monarquia angolana falhar.

Re-ressuscitado

«Veja como seria Michael Jackson sem as plásticas» revela a brasileira Super Abril.

domingo, 28 de junho de 2009

A estética do regime

Muita da estética do actual regime político angolano está representada nesta foto, que mostra uma reunião do Conselho de Ministros presidida pelo Presidente da República. Não se trata de um encontro normal, no sentido em que um grupo de pessoas se reúne a uma mesma mesa para discutir ou debater determinado assunto. Pelo contrário, a foto mostra uma reunião entre várias pessoas mas em duas mesas. Em redor de uma delas, subalterna, sentam-se ministros e seus representantes e, na outra, bem mais alta, abanca-se o presidente. Primus inter pares. É o que quer dizer o meio metro de altura entre as mesas de JES e dos outros. Daí a estranheza da população pelo mais conhecido argumento presidencial sempre que uma medida do governo barraca. Que «não sabia de nada». Vai-se a ver porque o palanque presidencial estará excessivamente afastado da mesa ministerial.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Cabinda

«Human Rights Watch denuncia violações dos direitos humanos em Cabinda». Algumas práticas aqui descritas de tortura sobre prisioneiros sugerem Guantanamo. Numa guerra surda já não contra Bin Laden e os seus seguidores mas, quiçá, ainda contra os inimigos, se não da América, da texana Chevron. Mais a sua base do Malongo, onde alberga os guardiões do mais importante poço de petróleo fora dos States.

domingo, 21 de junho de 2009

Grande Líder finalmente

À volta da enorme mesa oval onde se reunem os, até agora, grandes deste mundo o espectáculo é desolador. Qualquer um dos presentes, sete homens e uma mulher, não consegue resolver um único dos problemas que têm em mãos. Há uma clara falta de liderança entre eles. Daí que o desânimo rapidamente vire alheamento. Sarkozy revira os olhos por um número antigo da Vogue, Medvedev aprecia um álbum de fotografias do perfil de Puttin, Brown procura com sofreguidão primeiras páginas de jornais com notícias de demissões, Berlusconi recebe SMS's a chamarem-lhe Papi, Harper folheia uma enciclopédia histórica sobre a gloriosa Frota Branca, Taro testa um novo i-phone da Sony, Obama mata moscas e Merkel boceja com tanta inactividade. Até que, de repente, o anfitrião Berlusconi anuncia. «Tenho uma ideia. Na próxima reunião, vou convidar para a presidir o único homem capaz de nos orientar». E vai daí todos os seus colegas do G-8 se irmanaram naquilo que já é um acordo histórico. «Presidente de Angola convidado para cúpula do G-8». O mundo encontra-se suspenso dos resultados dessa reunião.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Léo Ferré - Avec le temps

Ainda hoje consigo rever o instante de espanto em que fui caçado quando a TV do Portugal recentemente saído das brumas me apresentou esta chanson miada em lágrimas por este, lembro-me muito bem das imagens que o ecran divulgou, faquir de um circo ambulante de ciganos espanhóis, pirata saído do cesto da gávea de um navio capitaneado por Sir Francis Drake, pintor flamengo clássico com a cara macerada pelo químico experimentalista das tintas. Um espanto que ainda hoje persiste. Apesar do tempo.

terça-feira, 16 de junho de 2009

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Campeões, campeões, nós somos ...

Mal nos demos conta desta notícia, «Luanda manteve 1.º lugar na lista das cidades mais caras do mundo», os cerca de seis milhões de abramovichs, ronaldos, florentinos, gates, buffets, slims, geldorfs, santos e tutti-quanti que estimamos habitar em Luanda irrompemos numa festa tão incontida quão espontânea. Descemos dos nossos andares pelas escadas que serpenteiam os elevadores, quando os há, avariados ou transformados em despensas, conseguimos saltar sobre o lixo entulhado nos halls dos prédios, passamos a portaria sem portas a que deveríamos antes chamar sem-portaria, galgamos os buracos abertos nos passeios onde os chineses plantaram há anos uns canos pretos de um saneamento que nunca vimos funcionar e encontrámo-nos todos no meio da rua, festejando com a malta que, nos seus carros sem seguro, espelhos ou matrículas, já ali se concentravam num engarrafamento desde as 7 da manhã, como de resto fazem todos os dias, para festejar a conquista, como sempre bem suada, de mais este campeonato.

domingo, 14 de junho de 2009

O arquipélago da insónia

Um destes fins-de-semana, numa sombra da praia do Cabo Ledo, dei por terminada a leitura do último livro de Lobo Antunes. No dia seguinte, recomecei a lê-lo. Do princípio.
De onde me virá a impressão que na casa, apesar de igual, quase tudo lhe falta? As divisões são as mesmas com os mesmos móveis e os mesmos quadros e no entanto não era assim, não era isto, fotografias antigas em lugar da minha mãe, do meu pai, das empregadas da cozinha e da tosse do meu avô comandando o mundo, não a presença, não ordens, a tosse, um lenço saía-lhe do bolso e desarrumava o bigode, o meu pai prendia o cavalo na argola e a seguir apenas o restolhar da erva que esse sim, mantém-se, embora seco e duro até depois da chuva, na varanda os campos que conheço e não conheço, o renque de ciprestes que conduzia ao portão e além do portão com um dos pilares tombado os sobreiros e o trigo, a vila cada vez mais distante onde as luzes acentuam o escuro, um sítio de defuntos em cujas ruas trotava abraçado ao meu pai, assustado com os postigos vazios e a certeza que nos espreitavam nos amieiros da praça no tempo em que nada faltava na casa, a minha mãe no andar de cima a perfumar baús, a chávena da minha avó no pires e ela fixando-me com um olhar de retrato que atravessava gerações vinda de um piquenique de senhoras de bandós e cavalheiros de colarinho de celulóide comigo a pensar se toda a gente continuaria aqui em conversas que o relógio de pêndulo afogava no coração pausado, uma tarde encontrei a chávena e o pires num canto da camilha e a cadeira sem ninguém, uma outra tarde os baús do andar de cima cessaram de cheirar só que dessa ocasião automóveis no pátio, senhores que me despenteavam numa lástima amiga
- O órfão
Não conheço ninguém que escreva em português tão bem quanto Lobo Antunes. Aliás, não conheço ninguém que escreva tão bem quanto Lobo Antunes.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Aniversário

Num comentário ao post anterior, o colega Reflexos lembrou a data. Em 12 de Junho de 1850, ou Julho, já não me lembro bem e a Wikipédia pelos vistos também não, nasceu em Ponta Delgada o grande Roberto Ivens. O verdadeiro. Que andou por estas mesmas partidas do mundo a desbravar matas e mentes. Para os mais distraídos, bora lá então a seguir o link da sua biografia na Wikipédia.



O provincianismo português

Acabo de ver o «Jornal das 9» na SIC Noticias, que iniciou e demorou 33 minutos a falar da transferência de 80 milhões de libras do futebolista Cristiano Ronaldo do Manchester United para o Real Madrid. 33 minutos. Onde coube a notícia, as repercussões na imprensa de todo o mundo e arredores, nos adeptos, tanto de ambos como de nenhum dos lados, dois repórteres a repetir em directo das portas dos clubes envolvidos quer a notícia da transferência quer as repercussões na imprensa de todo o mundo e arredores e nos adeptos de ambos os lados a quem tentavam caçar na rua os testemunhos cheios de conteúdo técnico, entrevistas gravadas ao «Melhor do Mundo» a repetir vezes sem conta que nunca abandonaria o United sem que entretanto lhe caísse a tinta do lipstick, declarações entusiasmadas de opinadores profissionais do fenómeno desportivo mas também, se lhes pagarem, de quaisquer outros fenómenos mesmo que não-desportivos, reportagens sobre o passado do craque sem que desta vez lhe juntassem, obrigado, imagens da irmã a cantar em discotecas e feiras a célebre canção-poema «Mano», até ao arrolamento, ditado por um pivot perfeitamente babado, das várias namoradas do starlette até agora CR7 mas futuramente CR-outro-número-qualquer, que incluiu um video sacado por um paparazzi de Beverly Hills a uma sua entrada às 3 da manhã, com saída 1 hora depois, na mansão de Paris Hilton. Uaauuu. Quando acabou a peça, o apresentador ainda mantinha a boca aberta. A notícia a seguir, como seria previsível, já foi uma ganda seca. Os depositantes do BPP abandonaram finalmente a vigília junto das instalações do banco que lhes ficou com as economias. Bééé, grande coisa. Lembrei-me do velho Pessoa, a quem o pivot do «Jornal das 9» certamente consideraria gá-gá, que consta não ter feito culturismo para além do cotovelo para cima, não pintava os lábios na côr strawbery, usava sempre um chapéu que não lhe deixava espaço para grandes poupas e, se fosse futebolista, seguramente que não olharia três vezes para o ecran da TV dos estádios antes de marcar os livres directos. Em contrapartida, tinha uma ironia que deixou dele a imagem de um gajo com uma pinta do caraças. Como este texto, já velho de noventa anos.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

O gato e as filhóses

«Portugal empresta 500 milhões a Angola». Agora que vê posta em causa a legitimidade de decidir sobre os grandes empreendimentos estruturantes do País, Sócrates arrisca-se a que o TGV chegue mais depressa a Luanda do que a Madrid.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Ortografia zerada

Export Development disponibiliza um bilião de dólares para Angola. Um bilião? Com quantos zeros? 000.000.000? 000.000.000.000? Afinal, em quantos ficamos?

segunda-feira, 8 de junho de 2009

63%

Há muito que, nas empresas modernas, os objectivos comerciais ou o desenvolvimento de desempenho são levados muito a sério. Tanto que, no final do período da avaliação, os cumpridores são premiados e os reiteradamente não-cumpridores são muitas vezes relegados para tarefas menos apetecíveis. Na política este tipo de conceitos ainda não germinou. Daí que, nas eleiçoes europeias, em Portugal como em quase todos os países do continente, um resultado de 37% na ida ás urnas não penalize os políticos incapazes de mobilizar as suas populações. Cortes em bónus, despesas de representação, cartões de crédito, plafonds automóveis, fundos de pensões, quantas vezes até salários, transferências para outras áreas na rectaguarda do «combate político», secretariado, arquivo, colar-cartazes, até, quiçá, o desemprego. Na prática, o que pode acontecer a qualquer outro trabalhador que tenha tido o azar de bater á porta de uma empresa moderna. Estou em crer que, em alguns nomes da política portuguesa, se descobririam novas vocações.

sábado, 6 de junho de 2009

Euro quê?

Nas vésperas da reflexão sobre o sentido do meu voto nas próximas eleições europeias, aprestei-me a assistir ao último debate na RTP N entre os cabeças-de-lista dos cinco maiores partidos portugueses. A ideia era decidir se valeria a pena entrar, mais a minha mala-de-cartão, na embaixada lusa em Luanda para deixar lá uma cruzinha. Quase desconjuntei a mala. O que deveria ter sido um debate esclarecedor, pelo menos para o ouvido deste emigra pontualmente impedido de desfrutar da musicalidade dos políticos da Pátria, acabaria por se transformar numa ópera bufa. A conversa seguiu num linguajar algo parecido com o futebolês, com o quinteto-de-ataque permanentemente a ameaçar com o daltonismo das suas próprias cores, puxando para temas certamente caros a empregadas domésticas, num argumentário de cassete e, quase todos, numa postura de brilhantes barítonos incompreendidos que anseiam por se atirar para a marquesa do psicanalista. Se a ideia era apresentarem-me a Europa, pois cá por mim tenho a declarar ter ficado a conhecer muito melhor o Cunene. Fica, então, decidido. Amanhã, dia de eleições para o Parlamento Europeu, vou votar nos caranguejos das areias finas do Cabo Ledo.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

AF 447

Todas as vezes que levanto voo tento abstrair-me daquela estranha dor de rins que insiste em pregar-me ao solo e pensar em qualquer outra coisa que me retire da insustentável leveza de estar naquele momento cintado a um avião. Acabo quase sempre por me concentrar em tentar adivinhar a metodologia dos que, em meu redor, utilizam as suas próprias estratégias de diversão, procurando ausentar-se nos livros, nos auscultadores, na TV, no forcing do sono, ou, simplesmente, em rebater a cabeça no banco da frente. É nestas ocasiões que acabo por invejar os que resolvem tudo isto com um furtivo benzer de dedos nos vértices de um triângulo fantasma. Afinal, cada um cozinha a fuga com os condimentos de cada qual. Dou por mim a pensar nisto enquanto vejo na TV o pai de uma das vítimas do voo AF 447 da Air France a reclamar a ida ao local do acidente, onde acredita poder ainda haver sobreviventes. O que resgato desta esperançada reclamação paternal é, afinal, a presença daquela mesma angústia sentida aquando do levantamento dos meus voos, agora, certamente, bem mais nua, gelada, pesada, sufocante, vertiginosa, irreversível, definitiva, já sem espaço para quaisquer manobras de diversão. Porque aí, desgraçadamente, passa a ser mesmo a doer. Paz às suas almas.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

História a escalpelizar

Portugal é um dos alvos principais da guerrilha em Cabinda. Num país de que se diz ter tantos segredos quantos os contratos de petróleo, há um que é considerado o mais mal guardado de todos. O da inexistência de guerrilha em Cabinda. Tantas vezes anunciado o fim da FLEC, mesmo que por antigos militantes entretanto seduzidos pelo partido do poder, espanta-se que, afinal, a guerrilha cabinda ameace cortar cabeças aos estrangeiros que por lá cirandam. E logo privilegiando as dos tugas! Tudo por causa de um ininteligível processo de descolonização levado a cabo pelos portugueses, que entregaram esta província aos angolanos que eles referem nunca ter sido. Como desconfio que este imbróglio histórico não ficaria melhor esclarecido se fosse protagonizado por um descendente dos ex-colonos, decidi-me para já a riscar Cabinda da minha agenda mais próxima. Entretanto, fico na expectativa de que a guerrilha local passe rapidamente o cisma para os colonizadores dos tempos modernos. Os chineses. Que sempre terão a vantagem de oferecer uns escalpes bem mais maneirinhos.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Marcianos

Cavaco nega ter escondido compra de acções da SLN. Após ter ouvido na TV estas declarações do Presidente da República Portuguesa fiquei com a sensação de que, ultimamente, tenho vivido em Marte. O que não será verdade pois que Angola fica, apenas, a cerca de seis mil quilómetros de distância daquele pequeno rectângulo habitado por um povo, historicamente viciado na prática da auto-flagelação, que tende a minimizar a dimensão da democracia que, apesar de tudo, vai construindo. Após esta breve e fugaz percepção das virtudes do berço, resta-me aguardar que Cavaco Silva, por fim, não se deixe levar pelo neo-realismo que tem afectado o private people luso e passe também a engrossar a fila dos que estão a assaltar as instalações dos bancos que lhes descamisaram as poupanças. A bem da Nação.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Inquietação



A notícia desta explosão em Gouveia deixou-me preocupado. Muito embora nunca me tenha passado pela cabeça começar-a-ter um rebanho de ovelhas, ou começar-a-ter um café, confesso que começava-a-ter a ideia de vir a tirar a carta de tractor. Poderei, por isso, vir a ser motivo de inveja por parte dos meus vizinhos, mesmo dos que não saltam para a rua ainda em cuecas? Tipo virem a dinamitar-me o tractor, por exemplo? Estou deveras preocupado com essa possibilidade. Pelo sim, pelo não, vou mas-é parar de começar-a-ter a ideia de vir a tirar a carta.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Dia dos petizes

Hoje, Dia Internacional da Criança, foi, mais uma vez, feriado nacional em Angola. Até agora, o décimo segundo. Consta que só haverá mais quatro até ao final de 2009. Num país em que se estima que 50% da população tenha menos de 18 anos, esta será uma inegável ocasião para festejar. E onde, talvez também por isso, os petizes até se atrevem a reivindicar o aumento da idade de saída da clandestinidade.