quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Sinfonia lusitana

No início do jantar o ambiente na sala estava sereno, quase monocórdico. Uma meia dúzia de mesas jaziam ocupadas por alguns grupos de pessoas que certamente sussurravam os balanços das respectivas jornas. Os empregados, equipados com grandes cartes, pareciam patinar os salamaleques dos modos por entre as mesas redondas do restaurante. Alguns toques de pratos, talheres e copos compunham a orquestra daquele soturno semi-silêncio. De repente, entra um grupo de seis jovens tugas. Certamente informáticos, a avaliar pelas grossas bolsas dos laptops com que vinham armados. Aproximaram-se da requerida mesa-para-seis, entrecruzaram mútuos esgares de assentimento e decidiram-se a sentar. Antes, ainda tiveram tempo para largar as armaduras no meio da pista, inconscientes dos eventuais estragos causados à arte dos empregados de mesa. Enquanto ainda hesitavam no que pedir, na bolsa polifónica das sugestões do menú, um deles começou por degustar a confirmação da reserva do bilhete de avião que conseguira obter nessa tarde e que lhe pusera o Natal mais próximo. Daí a uns minutos, como que por antecipação, todo o restaurante luzia do colorido de recordações intermitentes, que misturava bacalhau cozido com vinho-fino, nozes com rabanadas, a casa da avó com lareiras acesas e muitas outras inconfessadas memórias, todas polvilhadas por secretos sacos de prendas, num surto de alegre cacofonia que inexplicavelmente se espalhou por todas as outras mesas entretanto preenchidas. Inexplicavelmente? Talvez não tanto assim. Afinal, trata-se da sinfonia lusitana em que se vai transformando o ambiente de pré-Natal que se vem vivendo em Luanda.

10 comentários:

Anónimo disse...

os cus do lobo eram em cazombo e arredores, muito longe do mussulo.

como só oiço falar em luanda...!

Anónimo disse...

Bom dia

Passo por aqui todos os dias gosto imenso da sua escrita .

Beijinhos

Carlota Joaquina

Nilson Barcelli disse...

A saudade também terá ajudado a criar esse colorido abacalhoado...
Bfs, abraço.

Roberto Ivens disse...

Anónimo,

Tem razão, tenho andado muito longe das peugadas do Judas, num continuado circuito hotel-emprego, de segunda a domingo, que me tem impedido, inclusivè, de conhecer o Mussulo...

Roberto Ivens disse...

Carlota Joaquina,

Obrigado, então, pela fidelização, que espero que valha a pena...

Roberto Ivens disse...

Nilson Barcelli,

Diz-se que a saudade foi inventada por portugueses, o que, para mim, começa agora a fazer mais sentido...

Anónimo disse...

Caro Roberto gosto muito da forma como escreve,todos os dias visito o seu blog.Hoje percebi que ainda se tornou mais enriquecedor,ao ver seus comentarios ,dando resposta a cada um dos intervenientes.Fico na expectativa de ter o mesmo direito aguardo seu comentario ao anonimo dois combinado?
Com votos das maiores felicidades por terras de Africa e que tenha um bom regresso a terra Natal.Abraços.

Roberto Ivens disse...

Agradeço e devolvo os votos do último Anónimo, que creio não poder ser "dois".

Sobre isto do anonimato dos comentários, não tendo nada contra (o anonimato, que não certos comentários) seria bom que se habituassem a ter nome ou nickname, mesmo que não registados no blogger. Sempre tornariam mais perceptíveis os diálogos.

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

olá, Roberto!

Dei uma escapadela por aqui e continuo a gostar de o ler, pois o Roberto tem uma escrita bonita. Não dê,pois, importância aos comentários desagradáveis.

Roberto Ivens disse...

Juliami,

Escrita, porventura, bonita, mas não comparável à da Lispector...