quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Caos com rodas

Mais de um ano após me ter estabelecido aqui, comecei a conduzir em Luanda. E, até agora, estranhamente, tenho sobrevivido ao caos. Dos hell angels dos candongueiros mais as suas loucas investidas por todas as faixas de rodagem existentes e a existir, como os inventados corredores prioritários que convencionaram ser os dos seus Bus, na realidade, bermas e passeios que por aqui deixaram há muito de ser exclusivo dos peões. Do acompanhamento furtivo do enxame de motas e motorizadas, cuja inimputabilidade perante regras de trânsito ou qualquer sinalização existente, incluindo semáforos e sinaleiros, os transforma em invisíveis vítimas assassinas. Das regulares inversões de marcha em quaisquer ruas, ruelas, descampados ou avenidas, mesmo se apenas com um, dois, ou mais sentidos, que por aqui são os que apetecem a cada um em cada momento. Do constante assédio de arrumadores, que podem variar para seguranças, guardas, nocturnos e diurnos, polícias ou simples transeuntes, à chegada ou à saída de qualquer lugar, todos especialistas em avaliação patrimonial dos terrenos que o automóvel pisa, aqui são cem kuanzas, ali duzentos, para sair daqui nunca menos de quinhentos. A forma como tenho conduzido, confesso, em constantes relatos como se na transmissão radiofónica de um jogo de futebol, será um inferno para quem me acompanha, principalmente se no lugar-do-morto. «Cuidado!», «sai da frente, pá!» e «olha-me este caramelo!» serão dos mais simpáticos e traduzíveis momentos da antena. Os restantes mimos já serão mais do universo dos comentários de balneário.

4 comentários:

yes! my love! disse...

Roberto,

se der uma voltinha de candonga pela produção blogoesférica portuguesa,

verá que os mimos trocados entre os candongueiros de Luanda, lhe parecem mais doces que uma serenata ao luar~

http://controversamaresia.blogs.sapo.pt/158880.html

Roberto Ivens disse...

yml,

Acredito, mesmo não tendo tempo, e Movinet, para frequentar a blogosfera...

Anónimo disse...

Um pequeno apontamento que pode ilustrar a Luanda que conheci e passei a gostar. Um fim de tarde junto ao Kinaxixe, encontro um ardina. Peço um jornal e entrega-me três, o mais recente era do dia anterior. Depois de "falar bem" fico com os três jornais. Juro que nunca tinha comprado três jornais e todos atrasados. Era assim Luanda, não se vivia só de trabalho mas tambèm de "esquema".

Roberto Ivens disse...

Antonio Ferreira,

Esses "esquemas" são, curiosamente, também uma forma de fazer chegar as coisas às pessoas. Se não fôr na rua, no meio do trânsito, não há muitas alternativas para comprar certas coisas. Um cinto para substituir o que ficou em casa, por exemplo. Com experimentação e furos a condizer logo ali na berma da estrada...